Ninguém espera receber um diagnóstico de câncer ou que
alguém próximo receba. Estamos tão alienados em nossa bolha e nos achamos tão
imunes a todo mal que existe, que cada vez mais esquecemos das coisas mais
valiosas da vida.
Quando descobri, no dia 11 de outubro de 2012, que o linfoma
do Gabriel havia voltado, fiquei sem chão. Foi sem dúvida alguma, a pior
sensação da minha vida. Um misto de medo, angústia, impotência, dor e
sofrimento se apossou de cada molécula
do meu corpo. Minha alma chorava, minha mente suplicava para que aquilo fosse
mentira e meu coração parecia que ia explodir. Tudo o que eu conseguia fazer
era chorar copiosamente, como se cada lágrima derramada fosse aliviar todos os
sentimentos ruins que eu sentia.
Os primeiros dias foram os mais difíceis. Perdi a
concentração para a mínima das coisas, não tinha mais sono, muito menos apetite
(pasmem). Havia em mim um turbilhão de sentimentos e pensamentos, vozes,
suposições, incertezas. Eu estava com muito medo e tudo o que eu queria era que
fosse comigo, e não com ele. Queria poder tirar toda dor que ele sentia, poder
acalmar o seu espírito, poder curá-lo. Mas, como disse Nietzche: “ninguém pode
construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio
da vida...”.
Os únicos momentos de serenidade plena, eram ao lado do
Gabriel. Os mais simples minutos perto dele, renovavam minhas forças e minha
fé. Não me sinto no direito de reclamar nem dos minutos em que ele estava com
dor, nem dos minutos em que ele estava apagado pela exaustão da quimioterapia,
nem dos minutos em que os efeitos dela começavam a aparecer. Em todos os
momentos, bons e ruins, eu pude sentir que o nosso amor estava lá, crescendo e
se fortificando, e principalmente, que Deus estava no controle e o amor Dele
era maior que tudo.
Aos poucos, o desespero foi se despedindo e no lugar dele
surgia uma força que nunca pensei em ter. E isso eu devo a muitas pessoas: a
minha mãe, que em muitas noites ficou ao meu lado até eu pegar no sono, ao meu
pai, que sofria comigo e tentava me animar com guloseimas e palavras de apoio e
a minha irmã, que mesmo distante sempre se fez presente e se preocupou mais que
pessoas que estavam tão próximas. Além deles, meus outros familiares também
foram incríveis e a família do Gabriel foi imprescindível, todos demonstraram
uma força e um amor tão grande, que me tranquilizavam quando eu não podia estar
por perto. Nos nossos amigos, encontrei ombros para chorar, conselhos, abraços,
carinho. No ambiente de trabalho, tanto meus colegas quanto meus chefes, me
apoiaram em cada instante e se demonstraram pessoas de corações invejáveis. Nos
desconhecidos, encontrei a caridade, o amor ao próximo que Jesus tanto pregou.
Nesses últimos três meses, todas as pessoas que cruzaram
nossos caminhos, que entraram em nossas vidas, que permaneceram conosco, me
mostraram que apesar de todas as coisas negativas, a humanidade ainda tem um
futuro lindo pela frente! Me mostraram que o amor, o carinho e o afeto fazem qualquer
tempestade se tornar um dia ensolarado! Hoje, depois do tratamento e da
remissão do Gabriel, sinto uma felicidade e uma gratidão inexplicáveis, que
transbordam e não cabem em mim! E é por isso que quero dividi-las com as
pessoas que passam pela mesma situação que passamos. Desde a primeira vez que
entrei na UOPECCAN, pude ver nos olhos de cada um o que eu estava sentindo,
pude perceber que éramos (e somos) todos iguais nessas circunstâncias. A dor
que os pacientes e familiares sentem, doem em mim, mesmo agora que está tudo
bem! E essa luta diária de tantas pessoas contra o câncer me motiva e me
inspira a seguir em frente e buscar uma forma de ajudá-los.
O câncer pode ser encarado como uma doença ingrata e
devastadora, que tira todas as suas energias e te deixa sem perspectivas, ou
como uma oportunidade de aprendizado, uma experiência que muda sua visão e seus
valores. Mesmo não sendo eu quem estava doente, posso afirmar que a Bruna de
três meses atrás já não existe. Aprendi a dar mais valor a minha família, ao
meu trabalho, ao meu estudo e as pessoas que me rodeiam. Minha fé se
fortaleceu, não preciso enxergar ou comprovar
que Deus esteve conosco nessa batalha. Simplesmente sei e testifico. Não
quero respostas, entendo que o interessante e o necessário é nossa mudança e
nosso crescimento frente a cada adversidade.
Próximo mês haverá o treinamento dos voluntários do Núcleo
Solidário da UOPECCAN, e eu pretendo participar. Não sei se é muito cedo, se é
muito recente, mas a verdade é que sinto que preciso retribuir pelo menos uma
parte da bondade que recebemos.